Presságio do céu austral
Revelação do Mal
Haftor acordou de seu sonho com um mau pressentimento. A visão fora breve, mas ele ainda se lembrava do símbolo anão que remetia a uma casa de ferreiros — embora não tivesse certeza de quem se tratava.
Quando Haldur despertou pela manhã, encontrou o irmão ainda refletindo sobre o que havia visto em sua mente. Haftor contou-lhe a visão e os presságios que dela inferia. Haldur, por sua vez, estava mais tranquilo quanto ao futuro, mas preocupado com os companheiros recém-encontrados. Os dois discutiram a moral do Guia e de seus aliados, assim como a confiança que pareciam depositar em Sornan, até decidirem estabelecer um voto de confiança.
O Guia usou seu talento para rastrear Sornan em Valengard. Encontrou o sekbete em sua refeição matinal e compartilhou o momento com ele.
Enquanto isso, Rector também havia sonhado de forma vívida — e teve uma surpresa ao descobrir que Olgaria passara por experiência semelhante. Animada, a jovem Zumi relatou ter visto seus ancestrais e, no sonho, usava pinturas faciais como as de Garuk.
O napol despertou o berserker arremessando-lhe uma pequena pedra. Surpreso, Garuk ouviu de Olgaria as visões que tivera durante o descanso. A jovem começava a despertar seus poderes de berserker e buscava nele a orientação necessária. Garuk contou sobre sua própria iniciação e o despertar de sua fúria selvagem. Aconselhou-a a observar a natureza como caminho de autoconhecimento:
— Veja a naturalidade com que as coisas acontecem. Não encare como violência, mas como forma de perpetuar a vida.
Então, ofereceu-lhe um totem ritualístico que ele mesmo confeccionara.
O próprio Garuk, por sua vez, procurou a orientação de Rector sobre a possibilidade de obter uma armadura feita dos restos mortais de escaravelhos, da qual já ouvira falar em suas aventuras. Rector não sabia onde encontrá-los, mas levantou a hipótese de Uno conhecer a resposta.
Enquanto isso, o Guia advertia Sornan de que Aymon não desistiria de persegui-lo. O ex-gladiador respondeu que estaria preparado para um novo confronto, fosse qual fosse o enviado contra ele. O Guia ainda lhe perguntou sobre Thal, o carcereiro de Caridrândia. Sornan disse não ter notícias desde a fuga, mas mencionou um humano residente em Trisque conhecido como o Atravessador, que supostamente conhecia a todos.
No salão da Taverna da Vanguarda, Haftor refletia sobre seu artefato e o sonho que tivera. Convencido de que a pedra aprisionava algo maligno, declarou suas suspeitas.
— Não se atreva a chamar a Aurora de algo maligno! — interrompeu Olgaria, visivelmente desconfortável. Criada com canções e histórias sobre a Aurora Gelada salvando o mundo, a guerreira não aceitava que um recém-chegado a difamasse.
Rector tentou ponderar, sugerindo que ainda não compreendiam por completo os efeitos das rochas, mas que acreditava em sua natureza benéfica.
— Eu não acredito que algo capaz de criar tamanha beleza seja ruim — argumentava o feiticeiro. — Eu sinto que ela suplica por ajuda. Não, tenho certeza disso!
O debate ainda prosseguia quando Sornan e o Guia chegaram. Após ouvir um pouco da discussão, o Guia pediu silêncio para que Sornan contasse a razão de sua fuga de Aymon Ghevra.
O sekbete relatou o mesmo que já havia revelado ao Guia na caverna: — Aymon realizou um ritual profano com estes objetos.
Referia-se à lança, ao artefato anão, a uma tiara e a uma adaga. Embora Haftor e Haldur tivessem recuperado a pedra anã, a tiara e a adaga haviam sido roubadas de Sornan em Telas e permaneciam desaparecidas.
Para testar se a lança reagiria às pedras da Aurora em posse do grupo, Rector e Garuk exibiram seus artefatos. Nada aconteceu com a arma, mas ambos foram tomados por uma angústia profunda e indescritível, como se algo dentro deles suplicasse por libertação.
Novos rumos
Embora o destino inicial fosse Trisque, as revelações de Sornan fizeram o grupo reconsiderar. Recordando a mensagem deixada na armadura trazida de Odrenvil e avaliando a logística da viagem, os aventureiros decidiram seguir até a Torre Branca do Sul.
Antes da partida, o Guia despediu-se de Thalanir e recebeu dele uma recompensa de cem moedas de prata. Garuk presenteou Rector com um totem semelhante ao que dera a Olgaria, enquanto o feiticeiro distribuiu suas poções entre os companheiros, preparando-os para imprevistos.
A viagem até a Torre Branca levaria alguns dias, mas o clima frio seria menos rigoroso do que até então. Na primeira noite em campo, os anões conheceram a casa dos sonhos de Rector. Lá, ele apresentou sua amiga imaginária, Sombra. Olgaria e Garuk pareciam já ambientados ao lugar, mas o Guia manteve-se afastado, permanecendo do lado de fora durante toda a noite.
No segundo dia, a estrada trouxe tensão: três cavaleiros em armaduras imponentes, reluzentes e fechadas, escoltavam uma carroça repleta de armas e peças metálicas de origem incerta. Ao avistarem os aventureiros, desviaram-se do caminho e postaram-se em guarda. O Guia encarou um deles, mas os cavaleiros não pareciam dispostos a brigar por tão pouco. Depois de cruzarem os viajantes, retomaram sua marcha, e o grupo prosseguiu o caminho.
Um cruzamento de presságios
O grupo alcançou um pequeno vilarejo na encruzilhada que levava a Trisque e Telas. Hospedaram-se em uma estalagem e o Guia saiu em busca de informações. Descobriu que o inverno estava excepcionalmente rigoroso e que muitos naufrágios assolavam a costa. Os aldeões associavam tais tragédias ao Mal-Sob-O-Gelo, e reclamavam da queda no comércio pela redução de embarcações.
De volta à taverna, os aventureiros se reuniram. A proprietária, Berta, uma humana de meia-idade, foi questionada sobre os cavaleiros. Ela confirmou que haviam passado por ali, mas disse não dar atenção ao que seus clientes falavam. Contudo, demonstrou surpresa ao ouvir sobre Caridrândia, o que levou o Guia e Rector a interrogá-la com mais insistência. Pressionada, admitiu que os cavaleiros seguiam para Telas, trazendo bens do extremo norte. Porém, os aventureiros não perceberam que a estrada por onde haviam cruzado não levava àquela cidade.
Garuk, com sua altura imponente e a bocarra de crocodilo, aproximou-se de Berta e a questionou, de modo nada delicado, sobre a armadura de escaravelho. — Com todo o respeito — acrescentou, com hálito de carne crua sobre o rosto da mulher.
Ela não sabia, mas uma elfa dourada hospedada no local interveio, incomodada com a pressão exercida pelo sekbete. A tensão cresceu até que sua companheira, uma elfa florestal, amenizou a situação em élfico, embora com certa arrogância sobre o “selvagem sekbete”. Por fim, Berta comentou que um homem conhecido como Atravessador, residente em Trisque, poderia ter informações sobre a armadura, pois “conhecia todo mundo”.
A Taverna da Encruzilhada era um prédio estreito, de quatro andares. Os quartos dos aventureiros davam vista para uma torre ainda mais alta ao lado, exceto o do Guia, que naquela noite decidiu dividir o espaço com os companheiros.
Na madrugada, o frio intenso foi acompanhado de neve. O Guia olhou pela janela e testemunhou uma aurora austral de tons azulados, ondulando como se apontasse para o horizonte e para as profundezas da terra. O presságio o encheu de desconforto.
Desceu até a rua, tocou o chão úmido e gelado, e uma sensação de aprisionamento o dominou. Os outros aventureiros saíram para observá-lo. Haftor notou que seu artefato brilhava com a mesma tonalidade azul da aurora, mesmo distante das outras pedras.
Quando todos se aproximaram, viram o Guia ajoelhado, sentindo o chão. Nesse momento, a neve transformou-se em chuva grossa e escura. Não era uma chuva comum: a água estava turva, quase negra. O presságio, confuso, havia se completado.
Taverna da Encruzilhada, Terras Selvagens, dias 26 a 27 do mês da Paixão do ano de 1502.
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