Sessão 13 – O complexo ecossistema em Trisque
O espetáculo na praça
O grupo despertou com os gritos vindos da praça da fonte, no centro do vilarejo de Trisque. Das janelas de suas hospedagens, viam um homem em trajes verdes sofisticados sendo arrastado por dois meio-orcos brutos, um masculino e uma feminina.
Falando alto e sacudindo um documento com uma das mãos, a meio-orca discursava, acusando o homem de traição:
— Aquele homem, Demétrius, o Atravessador, foi pago para nos dar uma segunda chance, mas transformou a sombra de um escravo em um cidadão comum, para que aos olhos de qualquer patrulha de nossos irmãos fossem apenas estivadores, pescadores invisíveis! — dizia Táviga, inflamando os cidadãos que se aglomeravam na praça para ouvir e ver o desfecho daquele julgamento.
A palavra “Atravessador” chamou a atenção do grupo. O Guia, em especial, agitou-se e desceu imediatamente de seu quarto. Haftor também foi até a praça, incomodado com aquele julgamento sem protocolo, embora o humano também lhe fosse útil.
Rector permaneceu em seu quarto. De lá, observou Lucius — o napol corvo encontrado junto com os orcos da caravana — pousar ao lado de Táviga e tentar chamá-la, sem sucesso. O feiticeiro então alçou voo e seguiu para a praça, decidido a intervir com sua presença.
Haldur e Garuk também se dirigiram para o centro do vilarejo, atravessando a multidão para observar o que se passava.
O Guia, mais apreensivo que os demais, sabia que o Atravessador era sua única pista sobre Thal. Empurrando aldeões pelo caminho, colocou-se diante da multidão, o mais próximo possível dos meio-orcos e do prisioneiro. Foi o primeiro a interromper a fala de Táviga:
— Ô dona, eu não sei como é que esse cara vai pagar, mas matar ele você vai não, tá? — disse o sekbete, em tom de alerta.
As palavras não a amedrontaram. Ao contrário, Táviga reagiu com fúria, exigindo que o aventureiro se apresentasse e perguntando se ele estava ciente dos orcos que Demétrius havia ajudado a passar pela cidade.
Haftor interveio logo em seguida. Apresentou-se como paladino e questionou a autoridade de Táviga para realizar um julgamento público. A meio-orca tentou menosprezá-lo, alegando que ele desconhecia os costumes de Trisque por ser um estrangeiro.
Rector, no entanto, conseguiu uma aproximação mais produtiva. Lucius pousou ao seu lado, e o napol sugeriu que Táviga suspendesse o julgamento para interrogar o prisioneiro. Embora ela não aceitasse de imediato, percebeu em Rector uma oportunidade de negociação e o chamou para um local mais reservado, enquanto ordenava que seus lacaios levassem o Atravessador ao estábulo.
O Guia, Haldur e Garuk seguiram os meio-orcos e o prisioneiro, receosos de que ele fosse morto às escondidas. A presença deles quase provocou uma briga, mas Zira — uma das carcereiras de Demétrius — conseguiu apaziguar a situação, mostrando-se mais sensata que Krel, o outro meio-orco que puxava o prisioneiro com brutalidade.
As negociações no vilarejo
Enquanto o prisioneiro era mantido sob vigilância no estábulo, Táviga conduziu Rector até uma pequena cabana próxima ao estaleiro para uma conversa reservada. Olgaria o acompanhou, mas permaneceu de vigia do lado de fora.
Táviga iniciou o diálogo repetindo o discurso da praça, afirmando que Demétrius havia falsificado documentos e permitido a entrada e saída de orcos em Trisque sem sua permissão.
A negociação de Rector, contudo, foi bem-sucedida. Ele e Táviga acordaram que o grupo levaria o prisioneiro sob a custódia do paladino de Crizagom. A história contada aos aldeões seria que os aventureiros estavam em Trisque para caçar o falsário, e que Táviga havia colaborado com a captura. Demétrius, desmascarado, seria levado para julgamento em Blur, o reino dos anões.
Enquanto o napol e a meio-orca selavam o acordo, Haftor era guiado até o local de repouso do ancião do vilarejo pelo comandante da milícia.
O ancião, embora fraco e de idade avançada, estava lúcido. Contou a Haftor que Táviga era uma boa pessoa, mas não poderia ser a líder do vilarejo — a tradição determinava que o mais velho deveria governar.
— Minha lamentação é que Dolmuk, o segundo ancião e meu sucessor, não é trabalhador, nem competente o suficiente para o serviço — confessou o velho.
Haftor compreendeu que, se Dolmuk assumisse o cargo, Táviga passaria a comandar o vilarejo por influência. Decidido a impedir isso, o paladino invocou um milagre: Bravura. O feitiço restaurou as forças do ancião, que se levantou e, junto de Haftor e do comandante, foi confrontar seu sucessor.
— Você deve abdicar de seu cargo quando a hora chegar. Lismira assumirá em seu lugar. Ela é muito mais competente que você — declarou o ancião, encontrando Dolmuk dormindo em sua rede.
Dolmuk, constrangido, aceitou a decisão. Aliviado, o ancião decidiu aproveitar suas últimas forças para uma despedida digna: foi até a praia, pediu um barco emprestado a um pescador e partiu sozinho em direção ao mar aberto — sua última jornada.
Enquanto isso, no estábulo, o Guia chamou Lucius para conversar do lado de fora.
— Eu sou o braço direito dela — disse o napol, quando questionado sobre sua função junto de Táviga.
Sobre Demétrius, explicou que ele vivia em Trisque havia muito tempo, fugido de um orco chamado Guzur, que ainda o perseguia. Táviga lhe ofereceu abrigo em troca de serviços, mas, ao ameaçar exilá-lo, o condenava de fato à morte.
Após a conversa, o Guia foi colher ervas. Garuk, notando sua ausência, saiu à sua procura, deixando Haldur sozinho com os dois meio-orcos e o napol.
O anão, inabalável, tentou uma abordagem amistosa. Zira, após aceitar uma caneca de cerveja, acabou conversando com ele. Falou de sua admiração por Táviga e afirmou que o Atravessador não seria morto — apenas exilado.
— Táviga deveria liderar este vilarejo, e provavelmente um dia vai — disse a meio-orca. Krel concordava entusiasmado, mas foi interrompido por Lucius:
— Vocês são tolos. Trisque é tradicional demais para aceitar Táviga como líder.
Irritada, Zira prometeu arrancar a cabeça do napol quando tivesse oportunidade, mas a tensão logo se dissipou, e a conversa seguiu em tom mais brando até que Haldur foi chamado de volta pelos companheiros.
Acordos fechados
Quando Rector revelou a Haftor o estratagema de Táviga, explicou em detalhes o acordo que firmara com ela e garantiu que nada havia de ilegal, acalmando o paladino.
A dupla reuniu o grupo na estalagem para apresentar o plano. Desconfiado até das paredes, Rector abriu a porta de sua casa dos sonhos para discutirem em segurança. O Guia, porém, recusou-se a entrar e ficou de guarda do lado de fora.
Dentro do refúgio mágico, Rector explicou a estratégia: pretendia que o Guia encontrasse alguma prova do envolvimento de Táviga com a chegada dos orcos em Trisque. Como o sekbete não participou da reunião, Garuk ficou encarregado de transmitir-lhe as instruções depois.
Com tudo definido, o grupo deixou o covil encantado e seguiu até a praça, onde Táviga conversava com uma humana suspeita. Ao ver os aventureiros se aproximarem, ela a dispensou.
— Negócio fechado? — perguntou Táviga, estendendo a mão para Rector.
O napol apertou a mão da meio-orca, selando o acordo que lhes permitiria levar o Atravessador para fora de Trisque.
Trisque, Terras Selvagens, dia 5 do mês do Sangue do ano de 1502.
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